A PRINCESA E O CAVALEIRO | ||
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o beijo
sexta-feira no MASP via um quadro, um retrato na verdade, dessas lindas criancas pomposamente vestidas. loiras e olhos claros, trajando dois lindos vestidos. entao voce N. repara: "conde tal e duque tal", senhor, era-me certo que se tratava de duas garotas, como podiam vesti-los e pinta-los daquela maneira? o que era dessas criancas quando adultos? dias depois, relembrando esse quadro, pensei na possibilidade e potencialidade de surgir um trauma dai, talvez eterno, posto que o retrato continuou. entao lembrei do meu trauma, aquele que me deixou como uma pecadora durante anos. mas antes de mais nada, pai e mamis, espero que percebam que o que escrevo aqui e de forma alguma culpando voces. e apenas um fato, mais um pedacinho de quem fui que por acaso relembrei e do qual me orgulho ao descobrir que ha tempos foi superado. o tal. em algum momento dos meus 2 ou 3 anos foi tirada uma foto beijando meu irmao na boca. ele, 3 anos mais velho. mas a questao e que foi um beijo mesmo, e partia dos dois, lingua e tudo, forte, verdadeiro demais, e registrado ali para todo o sempre. nao lembro de quando tiraram, nao lembro do momento, mas lembro claramente o que me causou quando alguns poucos anos mais tarde vi a foto. minha mae, muito orgulhosa da imagem, transformou-a num quadro e quis deixar a mostra pela casa. desde sempre fui terminantemente contra e talvez ate hoje nao entendam o porque do meu 'escandalo' ao nao querer o quadro pendurado pela casa. era uma vergonha tao grande que nao consegui colocar meu desespero em palavras. entao ficou na parede do quarto dos meus pais, afinal, la eles que escolhiam o que podia ou nao, e nem todos entravam ali. foi o maximo que consegui depois das minhas reclamacoes. um pecado. uma vergonha. um trauma que carreguei anos e anos. a cada vez que olhava e/ou recordava o quadro tudo vinha a mente. puxa vida, beijar meu proprio irmao, o sangue do meu sangue, daquele jeito. errado. errado. errado. e tinha medo de por isso ser crucificada. nao por meus pais que achavam tudo muito bonito puro e inocente, mas pelos outros, por qualquer um outro que tivesse acesso a ele e sim, por Deus. durante anos senti-me pecadora por causa da foto e por isso durante anos evitei qualquer contato fisico com meu irmao. sofremos, nos dois sofremos. meu proprio irmao e nao mais conseguia abraca-lo, pegar em suas maos, beija-lo. foi como se eu tivesse provado do fruto proibido, como se nao houvesse perdao. entao muito crianca e burra, achei que o melhor fosse me afastar. o toque nao poderia haver nunca mais entre nos dois. minha irma nasceu e junto ela trouxe o carinho e o contato de volta a familia. foi com ela que reaprendi a abracar, a tocar, a beijar meus pais, avos e irmao. foi dificil, um longo tempo ate que eu pudesse/conseguisse abracar meu irmao de novo, de todo o coracao, sem vergonhas, sem culpas. ate que hoje eu possa me deitar em seu colo, encostar em seus ombros, fazer e receber um cafune sem duvidas quanto ao que e certo e bonito e necessario. nao sei quando todo esse sentimento de culpa e vergonha acabou, nao consigo lembrar ou imaginar qual tera sido o ponto onde tudo se dissipou, alias, so me lembrei dessas coisas por causa daquele retrato que vi sexta no MASP, retrato que me deixou pensando no poder de uma simples imagem sua, mesmo que passada, mesmo que voce nao lembre do momento, o poder e a capacidade disso te traumatizar. nunca imaginei que pudesse um dia olhar novamente para essa foto com a naturalidade de quem olha para apenas simples recordacoes. hoje meu irmao, que relembro do que aconteceu, peco desculpas por tudo e tanto que perdemos, pois acredito que nunca as pedi. desculpa. posted by safiri @Tuesday, August 03, 2004
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